Sobre a questão da equivalência em tradução poética¹
O objetivo que se impõe ao presente artigo é o de discutir o referencial da estrita equivalência na avaliação crítica de traduções, para concluir que ele não se mostra o mais adequado à tradução de poesia.
A respeito da conceituação de tradução poética e do que seja “fidelidade” na ação tradutória, considere-se de início um pensamento como aquele elaborado por Haroldo de Campos (por meio de seus artigos sobre “transcriação”)2, que permite ver a tradução de um poema como uma criação de algo novo, com suas próprias “regras” internas, ainda que resulte de um processo de recriação e seja construído de modo a guardar relações de paramorfismo com o texto-fonte. As prescrições tradutórias de uma teorização como essa não determinam, necessariamente, procedimentos sempre idênticos ou uniformes, nem soluções encaminhadas pelas mesmas diretrizes; sendo um processo de criação, envolverá as escolhas do tradutor-criador a cada etapa de seu trabalho, iniciando-se com a eleição, pela leitura, do que considera relevante da “estrutura” do poema a ser “re-produzido”3 e prosseguindo com suas opções de composição e modo de “correspondência” com o texto de que parte. Existirá potencialmente, permitida por uma abordagem como essa, grande flexibilidade no processo de escolhas que levarão a resultados diferentes: abolindo-se uma relação de “servitude” em relação ao “original” – que deixa de ter o peso implícito à noção de equivalência completa, e com o qual o poema traduzido deseja ombrear-se, podendo ser visto como “original do original” –, o poema resultante da tradução será antes construído a partir de princípios e de processos considerados análogos ou correspondentes, do que de obrigações de equivalência palavra a palavra, ou efeito a efeito (sonoro ou imagético).