Após dizer a investidores que uma reviravolta estava próxima, companhia deve divulgar amanhã seu quarto prejuízo anual em cinco anos
Dois anos depois de Kazuo Hirai assumir como diretor-presidente da Sony Corp., ele está escorregando para uma rotina familiar. Após dizer a investidores que uma reviravolta estava próxima, a companhia deve divulgar amanhã seu quarto prejuízo anual em cinco anos.
Os consumidores migraram para marcas como a Apple Inc. e a Samsung Electronics Co. Agências de classificação de crédito rebaixaram a nota da Sony para o nível de altíssimo risco. E aqueles que acompanham a empresa há muito tempo temem que Hirai esteja mais focado em se livrar dos fracassos da companhia do que encontrar um produto de sucesso que poderia restaurar a reputação da Sony, que era considerada uma das companhias mais inovadoras do século passado.
"Hirai passa mensagens externas positivas. Mas ainda há uma imagem de que os produtos que não geram dinheiro são abandonados, embora não haja visão de longo prazo para que tipo de novo estilo de vida a Sony quer criar", diz Shingo Tamura, um ex-engenheiro da Sony.
Hirai, que deve apresentar a estratégia de longo prazo da Sony em 22 de maio, tem prometido renovar o problemático braço de eletrônicos da empresa em torno de três pilares: jogos, tecnologia de imagem e dispositivos móveis. "Às vezes, na Sony, nós ziguezagueamos no nosso caminho até chegar a grandes inovações, e outras vezes nós simplesmente falhamos", disse ele em uma apresentação de negócios em janeiro, em Las Vegas. "Mas, você sabe, na Sony, o fracasso não é necessariamente o fim. É uma razão. É uma razão para continuar tentando."
A empresa não quis comentar para este artigo antes da divulgação de resultados e da estratégia.
O novo console de videogame da Sony, o PlayStation 4, está indo bem. A Sony vendeu mais de sete milhões de aparelhos nos cinco primeiros meses depois do lançamento, até o início de abril, superando o novo Xbox One, da Microsoft Corp.
A Sony também vê boas perspectivas para seus reprodutores de música portáteis de alta definição, vendidos sob a marca Walkman, e para seus aparelhos de TV com resolução 4K, que promete uma melhor qualidade de imagem. Outros dispositivos, como sensores de movimento que podem ser acoplados a raquetes de tênis, têm a meta de reconstruir a marca Sony.
O problema é que, até agora, nenhuma das áreas de crescimento parece ser capaz de melhorar os resultados da Sony. As TVs 4K, por exemplo, respondem por menos de 10% das vendas globais de TV. E é difícil para produtos de nicho moverem o ponteiro de uma empresa com receita anual de quase US$ 75 bilhões.
Recentemente, a Sony projetou um prejuízo de US$ 130 bilhões de ienes (US$1,3 bilhão) para o ano fiscal encerrado em março - revertendo estimativa anterior de lucro de 30 bilhões de ienes. Problemas na divisão de eletrônicos anularam os lucros obtidos pelas unidades de cinema e música.
Mesmo o PlayStation não é mais a mina de ouro de antes, porque hoje os consumidores passam mais tempo jogando nos smartphones. A meta da Sony de vender 20 milhões de unidades do PlayStation no ano fiscal encerrado em março é 45% menor que a de seis anos atrás.
A Sony informou em fevereiro que vai vender seu negócio de computadores pessoais e desmembrar sua unidade de TV, mantendo 100% de seu controle. A Sony está contabilizando boa parte dos custos de reestruturação no ano fiscal encerrado em março, o que tem levado alguns investidores a dizer que o pior deve ter ficado para trás. "Não sei quando o próximo produto de sucesso deles virá ou quando a reestruturação vai acabar, mas ao menos eles estão no caminho certo", diz Arnout Van Rijn, diretor de investimentos da Robeco Hong Kong, cujo fundo tem investido em ações do conglomerado japonês há quase dez anos.
Um negócio viável na área de dispositivos móveis parece ser pré-requisito para o sucesso, já que os smartphones desempenham hoje o papel antes ocupado pelo PlayStation, o Walkman e as câmeras fotográficas Cybershot.
Em 2012, ano em que Hirai se tornou diretor-presidente, a Sony fez progressos em relação à meta de se posicionar como a terceira colocada no mercado de smartphones, atrás da sul-coreana Samsung e da americana Apple. Beneficiada pela sua força no Japão e na Europa, onde ainda colhe os frutos de uma extinta parceria com a sueca Ericsson, a Sony viu sua participação de mercado global subir para 4,3% em 2012, segundo a firma de pesquisa IDC.
No ano passado, porém, essa fatia caiu para 3,8% e a empresa ficou em sexto lugar. Embora seus smartphones Xperia tenham recebido avaliações favoráveis, os consumidores veem poucos motivos para trocar seus iPhones e Galaxys. Aparelhos chineses dominam o segmento de produtos mais baratos e, nos Estados Unidos, a Sony não tem um relacionamento forte com as operadoras de celular.
A companhia tem afirmado que não vai buscar volume e entrar numa competição de preços no segmento de smartphones, embora tenha lançado um modelo mais barato para mercados emergentes.
A Sony tem tido mais sucesso com um dos componentes-chave dos smartphones: as câmeras embutidas. Sensores da Sony são usados nos iPhones e em outros smartphones. Isso apoia um dos três pilares de crescimento de Hirai, o negócio de imagem da empresa. Mas mesmo o negócio de sensores enfrenta desafios. A Samsung, que usava sensores da Sony em seus principais aparelhos, passou a usar tecnologia própria no modelo mais recente, o Galaxy S5.
Muitas das questões sobre o futuro da Sony se concentram em sua identidade como empresa de produtos eletrônicos de consumo. Seus lucros hoje vêm em grande parte de negócios distintos, como o estúdio em Hollywood, a gravadora de música e uma unidade que reúne um banco e uma seguradora de vida no Japão. Em abril, a empresa informou que vai investir US$ 2 milhões para começar uma empresa no setor imobiliário do Japão.
Outras empresas de tecnologia do Japão, como a Panasonic Corp., a Toshiba Corp. e a Hitachi Ltd. contavam com unidades de fabricação de equipamento industrial quando seus negócios na área de consumo enfrentaram problemas. As três divulgaram lucro no ano fiscal encerrado em março. A Panasonic, por exemplo, gera cerca de 75% da sua receita com as vendas de outras divisões, como baterias para carros elétricos. No caso da Sony, apenas 10% da sua receita vem de outros negócios, segundo Atul Goyal, analista da Jefferies.
Alguns analistas dizem que a Sony deveria seguir a Panasonic e sair do mercado de TVs e de outros produtos de consumo que viraram commodities e são dominados pela China e a Coreia do Sul. Outros dizem que o segredo é unir o conhecimento da Sony em hardware com novos software e serviços, como o serviço de TV baseado em nuvem que a Sony planeja lançar este ano nos EUA.
"Claro que é bom ter áudio e vídeo cada vez melhores, mas não faz sentido, a menos que eles sejam parte de um ecossistema. Eles estão destinados a virar commodities", diz Koichiro Tsujino, ex-executivo da Sony que deixou a empresa em 2006.